domingo, 29 de março de 2009

Não sei.

O universo está repleto de sons. Quem sabe no teu coração esteja a música que sempre silenciosamente ouvi antes de adormecer, antes de as pálpebras incharem e partirem para o engate, antes de se mostrarem ao mundo naquela noite que adormeci que nem a mulher que morreu ontem de cancro mamário. Mesmo surda, conseguiria ouvi-la, assim como cega que estou, sou capaz de visualizar-te todos os segundos da minha vida e faço-o, sem pensar e pensando, aliando toda esta alienação a uma canção que tu cantas também. Sou feliz contigo, na mais feliz das maneiras e, mesmo triste reflectindo, consigo tactear o mais absurdo dos sentimentos, aquela dor na barriga tão conhecida e dificilmente descrita pelos demais apaixonados.
Sinto-me a entrar pela tua boca, a viajar-te o corpo, numa demanda que me levará ao tal som, porque não há nada como prazer e ambos sabemos tão bem disso, meu amor. Beijo-te as glândulas salivares que nunca tive oportunidade de alcançar, fixo a imagem delas numa parte qualquer do cérebro, paro uns segundos…acabei de ter a melhor imagem jamais vista…e o sabor?! Oh o sabor! Sabes a doce, a aletria coberta com canela, a uma tarde de inverno, chuvosa, a ver um filme dramático de domingo e a devorar o prato.”Pensa no melhor orgasmo que tiveste, multiplica-o por mil e continuas a não chegar lá perto”, é assim que me sinto. És a heroína que se espalha no meu sangue, que tem noites de sexo com os meus glóbulos vermelhos, é promíscua, é a melhor droga que tomei, és tu, é a dor, é o esquecer…é o pedir por mais, é o prazer, é o morrer, é nascer, é vida…Estou em êxtase, como se agora, não ouvisse, como se perdesse os sentidos, e, no meio desta perda de consciência, só uma permanecesse, a mais bela de todas que persiste no meu inconsciente, a de que te tenho e a de que sonho contigo todos os sonos que durmo, a consciência do som que ouço que é tão teu, tão nosso.
Acabei por trincar-te um pulmão, porque sei que é essa troca gasosa que acelera o processo, levei um bocado comigo, tirei-te dias de vida sem saberes para que mais depressa se realizasse o “para sempre” connosco e que o destino jamais desviasse a possibilidade de te roubar de mim, tu pertences-me, estás tatuado na minha vagina, eu consigo sentir-te aqui em baixo a tremer de frio, e a aquecer-me quando preciso.
Quero mais um “chuto”, preciso de uma dose… rapidamente.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009









(...) Tirando todas as brigas que tinhas com a mãe, uma vez que acabas por as aniquilar com o teu amor puro que me davas como forma de arrependimento por todas as tuas carências nervosas fruto da tua juventude problemática, éramos felizes.

Desafio:
- Dizer 9 coisas aleatórias a meu respeito, não importando a relevância, tendo de ter 6 verdades e 3 mentiras. Quem receber o Meme, deverá postar as 3 coisas que acha serem as mentiras do blogueiro que lhe passou o Meme.


- Fui à Disneyland.
- Tenho um revólver em casa, na mesinha de cabeceira.
- Estou a pensar em mudar de sexo
- Adoro pringles.
- Amo nirvana.
- Amo ler.
- Amo música.
- Não sou filha única.
- Sou espiritual mas não religiosa.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

In utero


Os dentes estão quentes. Agora, arrefecidos pelo vento que vai entrando na boca como um intruso e nos enche o interior de nada e o pensamento de muito, despejaram o chá que há muito se despegou. Que sabor grotesco a limão, e, no momento a seguir lembrei-me exactamente do revólver, daquele que há uns tempos desejava tê-lo em cima da secretária encostada à janela que dava para o mar. Lembrei-me de como era inocente a minha tristeza e voltei a sentir o meu voto de castidade nos seus tempos de feto. Era virgem. Completamente. Era o mundo no seu primeiro dia. Primeiro fez-se o dia. E depois veio a noite. Foi assim que tudo começou, foi assim que nos tornámos a memória viva do planeta.
A dor enfiou-se numa caixa em forma de coração. Está lá engavetada. Sempre que me tocam, sempre que ousam remexer-lhe no sexo, a dor atravessa-me como um rastilho de pólvora. Tem piada é que só tu o sabes fazer. Só tu me pões desta maneira. Na realidade, sempre quis um revólver não para acabar comigo, mas contigo. Gostava de te acorrentar dentro de casa, bem longe do teu vício, e pedir-te, com clemência que me amasses. Afinal, sou tua filha. Sou o resultado de um mero momento de prazer numa noite de primavera. E há quem diga que seja proibido terminar com a vida nessa estação do ano...


"This is the end

Beautiful friend

This is the end

My only friend, the end"



sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009


Todas as personagens da minha peça de teatro morreram contigo. Isto, nem mais, nem menos, porque não me imagino sem ti; não há nenhum fragmento de segundo que te deseje menos do que o que desejo agora. Gostava de tactear-te o corpo mas a vida pregou-me mais que uma simples cegueira, ela levou-me, também, ao desespero efémero de quem ama e não toca.
Guardo os possíveis segredos que se podem libertar do meu saco, na mão, bem presos com pintas de luz que atravessam os buracos entre os dedos. Prometo-me não arriscar sequer contar a alguém como é enorme o diário da tua ausência, da nossa, quero eu dizer. Não quero que ninguém tenha pena de nós. Basta a nossa.
Remexo no saco, dou voltas como se estivesse num programa rígido qualquer de uma máquina de lavar roupa, acabo sempre por perder o telemóvel, e, há dias em que penso que o faço conscientemente…como se fosse uma forma de me testar, de testar quanto tempo respiro sem um sinal teu.
Afinal, tanto eu como tu, sabemos que esse tempo não é muito, mas somos mais do que um relógio ocidental, somos o presente, o presente no seu grau maior de perfeição temporal.
Deixa morrer. Faz-te bem. Mata os outros e liberta-me. Obrigada.

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Olhei para o céu. Engoli as nuvens e ceguei-me com a sua beleza. Pobre criança, não merecia. Vidrei as pupilas de azul e com um pouco de branco à mistura tentei respirar a verdade, a triste verdade.
O mar, enfurecido, continuava no seu vaivém inconstante, e desesperadamente acabei por desejar que o pior tivesse acontecido comigo; era uma questão de justiça, não de vontade. Roubei muitos tempos ao tempo até tomar consciência do presente que acabava de viver. Senti uma vontade repugnante de lhe contar que o mundo continuava igual mesmo depois da sua partida breve, que o mundo, por muitos anos que passasse conservava a sua história, qualidades e defeitos. Queria provar-me que era melhor assim, que era melhor partir do que apagar-se aos poucos. Mas não, pobre criança!, mal sabia o que era o amor, pobre criança mal sabia que ainda havia tanto por descobrir.
Todos os dias são lindos para morrer, mas nenhum dia é bonito para se ver morrer alguém. São coisas que nos sujeitam a partir do momento que nos fazem. São coisas da vida, porque é, ainda na vida, que tudo se sente e que tudo dói. Vou ter saudades do teu sorriso. Adeus.

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Fucking with my head



A janela está aberta e, mesmo sentindo o frio cortar-me aos pedaços cada vez mais pequenos, encaro-o de olhos bem abertos e de olfacto apurado; quando se sentirem sós, façam isso, é uma óptima forma de vermos o quão somos incapazes de aguentar qualquer desconforto físico. Respirem, tentem inalar ar no meio daquele vento naifa, saturado de nada, tentem aquecer-se no meio dele. Não verão nada, somente frio, esquecerão as verdades sobre mundo e nao se lembrarão de felicidade tão cedo. Naquele momento, naquele preciso lugar, deparada para a janela apenas me preocupava em conseguir respirar bem e depois aquecer-me, sonhava com cobertores, aqueles de serra, aos quadradinhos cheios de pêlo; pensava numa chávena de chocolate quente, uma maravilhosa combinação de sabores e temperatura…só queria uma coisa quente que fosse e nada mais para além disso.
Se estiverem sós, façam isso.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Apocalipse



Os pássaros já não cantam, assobiam. O céu é mesmo azul e o mar está de facto poluído. As palavras nos jornais existem mesmo e as tragédias são a conjugação perfeita das letras pretas. Gostava que remodelássemos o significado das palavras e esperar que um dia as coisas mudassem de sabor; podia ser que sorríssemos ao ver o telejornal e apenas chorássemos a descascar cebola. Os animais estão fartos de procriar e nós de viver. Não somos a geração perdida, somos a última.